sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

GOLPES FINANCEIROS

Luis Nassif*
A montagem do modelo financista mundial – que agora se esboroa – começou a ser preparada logo no pós-guerra, concomitantemente com a definição do Acordo de Bretton Woods, que restringiu o jogo especulativo, o livre fluxo de capitais e as jogadas com o câmbio. É importante entender esse mecanismo cambial. Desde o início da financeirização mundial, ainda no século XIX, o melhor terreno para a acumulação rápida de capital residia nas grandes operações de arbitragem de moeda e de operações com títulos públicos. É a maneira mais rápida e indolor de conseguir as grandes tacadas, sem chamar atenção. Em razão de sua complexidade, essas operações passam ao largo da opinião pública. Estão fora da compreensão não apenas dos não economistas como dos economistas que não dispõem de conhecimento sobre os mecanismos do mercado financeiro. Em geral, a montagem depende de poucas pessoas: as autoridades econômicas, os banqueiros aliados e os especuladores previamente informados. Os que detêm conhecimento sobre esse universo compõem uma comunidade fechada, misteriosa, que lucra com os desequilíbrios orçamentários (trazendo dúvidas sobre a solvência do Estado) e externos (dúvidas sobre a capacidade de honrar pagamento em moedas estrangeiras). Diria, quase sem medo de errar, que provavelmente a maior parte das grandes fortunas geradas no Brasil nos últimos 150 anos proveio dessas operações. O economista Ignácio Rangel, estudioso dos ciclos econômicos brasileiros, constatou que, em cada período inflacionário, havia uma separação entre novos grupos, dinâmicos, e velhos grupos, em decadência. Os desequilíbrios inflacionários possibilitavam aos novos grupos acumular mais rapidamente o capital que lhes permitiria, na etapa seguinte, comandar a retomada da economia. Não era a inflação em si que permitia, mas as operações com títulos externos e com manobras cambiais. Por exemplo, o Estado emitia títulos cujo valor decorrido seria de, digamos, 80% do valor de face. Quando entravam em moratória, os valores dos títulos caíam para uma ninharia. Especuladores adquiriam por, digamos, 5 e depois revendiam para o Estado (União, estados ou estatais) por 30. Esses ciclos especulativos foram frequentes dos anos 30 aos 70. Um dos episódios pouco conhecidos da historiografia brasileira, que pode ser consultado nos arquivos de Vargas, foi uma manobra com títulos da dívida de São Paulo. O interventor Adhemar de Barros, no governo Dutra, inundou o mercado de títulos para pagar toda sorte de compromissos. Colocou na jogada o Banco Cruzeiro do Sul. Tempos depois, com os títulos virando pó, o presidente do Banco do Brasil, Guilherme da Silveira, deu declarações de que o banco estaria disposto a recomprar os títulos. Foi o que bastou para que seu valor desse uma pipocada, permitindo ganhos a quem havia adquirido anteriormente. Nos anos 50, as sucessivas crises da dívida brasileira permitiram toda sorte de operações. As dívidas eram pulverizadas entre bancos, fornecedores e público. Houve uma caça aos títulos nos Estados Unidos, o que possibilitou a constituição de grandes fortunas brasileiras. Um parceiro frequente dos investidores brasileiros foi o ex-secretário do Tesouro americano Douglas Dillon, cujo banco sempre teve negócios com o Brasil. *Jornalista

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