quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Combater os crimes eleitorais fortalece a democracia

Janete Capiberibe
A eleição municipal em Macapá, capital do meu estado e a cidade onde moro, foi cheia de fatos surreais. Mas tão pulsantes quanto o sentimento que a vitória do primo do governador só foi possível por uma seqüência de crimes eleitorais.
Fala-se, abertamente, que a eleição foi comprada, apesar do esforço do Tribunal Regional Eleitoral, incansável, mas com poucos recursos.
A atuação do TRE é elogiável diante da afronta que tentou impôr uma terra sem lei: uso de força armada, coação física e psicológica e abuso do poder financeiro sobre uma população carente, empobrecida, que mora na capital listada na última posição do Índice FIRJAN de Desenvolvimento dos Municípios. A exploração da miséria rendeu ao TRE e ao Ministério Público provas inegáveis dos crimes.
Apenas um dos processos contra o candidato do governador Waldez Góes, seu primo Roberto Góes, elenca tantas provas de uso da máquina pública que o Ministério Público conseguiu suspender os programas assistenciais do governo durante toda a campanha.
A Secretaria de Estado de Inclusão e Mobilização Social virou comitê do primo do governador. Seus familiares, pagos com dinheiro público, foram às ruas coagir os eleitores.
O Programa Renda Para Viver Melhor, antes pago por meio de cartão magnético, passou a ser pago em dinheiro vivo, para fragilizar os beneficiários à pressão dos que pediam, sem disfarce, o voto no candidato 12.
Reuniões da Secretaria serviram para ameaçar com a perda da bolsa se o vencedor não fosse o candidato do governador; para prometer uma remuneração inédita – chamada Travessia – aos jovens entre 16 e 24 anos a partir de 1º de janeiro de 2009; e para incluir beneficiários de última hora na distribuição de cestas básicas, do kit habitação e do kit bebê. As famílias fugiam aos critérios da lei que criou os programas. As cestas e kits eram entregues nas casas tão logo aderissem à candidatura da família Góes nas reuniões encabeçadas pela 1ª dama.
Gravações e depoimentos de beneficiários assediados do Renda para Viver Melhor revelam a 1ª dama e secretária do governo Marília Góes pedindo votos para Roberto Góes.
A mulher do governador foi às ruas com as prerrogativas e os favores do cargo para fazer campanha em eventos do governo estadual. Gravações das reuniões que tratariam do programa Renda Para Viver Melhor mostram o aliciamento explícito em favor do candidato que ganhou a eleição.
Os depoimentos de todas as testemunhas sustentam a existência dos mesmos crimes eleitorais em diversas ocasiões.
Tanto a 1ª dama quanto a coordenadora do programa Renda para Viver Melhor, Benedita Elielza GÓES de Oliveira, em depoimento à Polícia Federal, alegaram participar de reuniões do governo em período de férias, mas sem provas e diante das evidências, voltaram atrás logo depois. Isto é, estavam, sim, pedindo votos para o candidato 12, escolhido pelo governador, em eventos do governo do estado, em horário normal de expediente.
O candidato conhecia a artimanha para trocar benefícios e promessas do governo por votos, tanto que a coordenadora do Renda para Viver Melhor, ao ser presa, foi assistida imediatamente pela advogada pessoal e da coligação do candidato Roberto Góes. Ao mesmo tempo, na sede da Polícia Federal, a advogada e a coordenadora tentavam influenciar o depoimento de outras testemunhas.
É importante, para o aperfeiçoamento do processo eleitoral brasileiro, trazer a público estas denúncias. Programas ditos de inclusão social não podem criar currais eleitorais.
É imperativo coibir os crimes eleitorais e todos os outros crimes, especialmente na esfera do poder público, para garantir o estado democrático de direito no Amapá e no Brasil.
*Janete Capiberibe é deputada federal e preside da Comissão da Amazônia na Câmara dos Deputados. Foi exilada política pela ditadura militar. Vereadora, deputada estadual e secretária de estado na redemocratização

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