
Minha jornada de candidato começava muito cedo, de casa em casa, visitando os eleitores, apresentando minhas propostas, falando de como representaria o povo do Amapá na Câmara Federal. Meus interlocutores, meio desconfiados, quase sempre permaneciam em silêncio, sem muita disposição para o diálogo. Em uma manhã ensolarada de outubro, já na semana da eleição, parei na 1° de Maio, no local, onde mais tarde, seria edificada uma feira municipal. Ali havia meia dúzia de bancas que vendiam de tudo um pouco. Parei para comprar camarão. Fiz o meu pedido, enquanto o feirante pesava, tratei de puxar conversa sobre as eleições.
Então? Em sua opinião, quem serão os eleitos no domingo?
- O professor Paulo Guerra, com certeza o mais bem votado, disparou o feirante.
E os outros? Afinal devemos mandar quatro representantes à Câmara Federal.
- Bem! Acho que...
Pausadamente declinou vários nomes sem mencionar o meu, tão pouco me reconheceu, não era para menos, vivíamos os primeiros passos da redemocratização, o horário eleitoral gratuito na televisão se limitava à apresentação do curriculum do candidato acompanhado de uma fotografia três por quatro. Decidi então inquiri-lo. O que é que você acha do Capiberibe? Com um punhado de camarão na mão a meio caminho da balança o homem paralisou, em tom de confidência, me segredou:
- Ih rapaz! Fale baixo! Esse cara é perigoso. O pastor da minha igreja disse que ele é comunista, que é terrorista que se for eleito vai tomar nossos filhos e levar para um lugar, se não me engano, chamado Rússia, onde nunca mais vamos poder vê-los.
Foram-se os anos. Vivemos no tempo presente, em 2008, vinte e seis anos depois, precisamente a três dias do segundo turno da acirrada disputa pela prefeitura de Macapá. Toca o telefone, eu atendo, do outro lado da linha, uma prima minha.
- Oi Capi! Estou muito preocupada com o que estão falando do Camilo. É muito sério, acho que você precisa fazer alguma coisa. Claro que não é todo mundo, porém alguns desinformados terminam acreditando nas histórias que estão espalhando nas igrejas.
Que histórias são essas, perguntei-lhe.
- Espera um pouco, fala aqui com minha amiga que ela vai te contar. É seu Capi - retomou a amiga de minha prima - eu estou muito triste com que estão falando do Camilo. Na verdade é o próprio pastor da minha igreja que está falando essas coisas, já disse a ele que isso não é verdade mas ele não me ouve.
Afinal! O que é mesmo que estão falando do Camilo?
-Eu vou lhe falar, porém antes quero lhe pedir para não dizer que fui eu que lhe contei. Sabe! Eu não quero desavença com o meu pastor, não concordo com ele, por isso estou lhe contando, mas não quero ter problema com ele.
Tudo bem! A senhora tem a minha palavra.
- Eles estão dizendo que os irmãos não devem votar no Camilo, porque ele é macumbeiro e pertence a uma seita que sacrifica criancinhas em seus rituais. Eu sei que isso é um absurdo, faça alguma coisa, pois tem gente, não são todos, claro! Que de tanto ouvir essas histórias terminam acreditando.
Agradeci pela informação e lhe disse que falaria com o pastor. Também tratei de convencê-la que nesse caso, ela poderia fazer muito mais do que eu.
Sabíamos que desde o começo da campanha que aterrorizar as pessoas desinformadas, com boatos e mentiras, fazia parte do conjunto de ações, pensadas cientificamente e colocadas em prática de acordo com o planejamento estratégicos dos adversários de Camilo.
Concluo dizendo, ao longo de minha vida pública tive que conviver com brutais injustiças. Fui e continuo sendo vítima de todo tipo de calúnias e difamações simplesmente por insistir, e marcar posição, em defesa de uma sociedade mais justa e humana. No entanto, o que me parece absurdo é constatar que o passado encontra eco no presente, porém é bom que saibam, Camilo é um quadro político qualificado, forjado na luta, absolutamente comprometido com a melhoria da vida coletiva. Resistirá, sempre!
*João Capiberibe, ex-prefeito, ex-governador, ex-senador pelo Amapá. Atualmente vice-presidente nacional do PSB.
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